Fármacos na Odontologia e sua influência no doping

Autores: Lucas Thomazotti Berard, Reinaldo Brito e Dias e Neide Pena Coto

O crescimento da prática esportiva tem sido observado principalmente em tempos de pandemia, onde a busca pela melhor qualidade de vida e de saúde pode ser adquirida por meio de atividades físicas, nas mais diversas modalidades esportivas. Eventos de notoriedade mundial como as Olímpiadas de Tóquio de 2021 e a Copa do Mundo no Catar em 2022 reforçam ainda mais a busca incessante pela igualdade, saúde e ética no esporte.

O doping é definido pela WADA (Agência Mundial Antidoping) como: “a utilização de substâncias ou métodos capazes de aumentar artificialmente o desempenho esportivo, sejam eles potencialmente prejudiciais à saúde do atleta ou de seus adversários, ou contrário ao espírito de jogo”. A WADA é uma organização independente que tem por objetivo coordenar o combate ao doping em todas as esferas do esporte profissional. Anualmente, a WADA revisa e divulga a lista atualizada de substâncias proibidas para os atletas profissionais e essa lista é categorizada de acordo com as classes farmacológicas a que as substâncias pertencem.

Sendo assim, a Odontologia do Esporte tem importância relevante na informação e prevenção dos casos de doping, já que, na prática odontológica, em suas diversas especialidades, o cirurgião-dentista precisa prescrever medicamentos específicos para o paciente/atleta que esteja sob determinado tratamento odontológico ou até mesmo em uma consulta de urgência odontológica.

Dentre os medicamentos comumente prescritos pelo cirurgião-dentista e que são proibidos por causar doping, a classe dos anti inflamatórios apresenta o maior número de fármacos: a Dexametasona, Betametasona e Prednisolona. Essas substâncias são rotineiramente prescritas na Odontologia após extrações dentárias, cirurgias periodontais, por exemplo. Estas substâncias são classificadas como Glicocorticóides – Categoria S9 da WADA –  ou seja, que vão atuar no combate a dor.

Na classe dos analgésicos, destacam-se a Neosaldina e o Tylex, medicamentos indicados em casos de dor e que sofrem risco de doping. A Neosaldina apresenta em sua composição o Mucato de Isometepteno, que é classificado como Estimulante do Sistema Nervoso Central – Categoria S6 da WADA – promovendo o aumento da atividade metabólica e do tecido cardíaco, elevação da capacidade de tolerância ao esforço físico e alteração do limiar de dor.  Já o Tylex, sua  composição básica é a codeína, que via de regra não é uma substância proibida; porém, quando a codeína passa pelo fígado no seu processo de biotransformação, é convertida em Morfina (Figura 1), que se configura como um Narcótico – Categoria S7 da WADA – atua de modo a diminuir e “mascarar” a sensação de dor.

Entre os antibióticos prescritos na prática da Odontologia, o único que é considerado doping, até o ano  de 2021, é o Otosporin, utilizado como medicação intra canal em casos de tratamento endodôntico, e contém a Hidrocortisona, que também atua como Glicocorticoide – Categoria S9 da WADA –.

Entre os antifúngicos indicados na prática clínica da Odontologia, o único com risco de doping, até o ano de 2021, é o Candicort, utilizado para o tratamento da Candidíase oral, que também é um Glicocorticoide – Categoria S9 da WADA –, pois apresenta a Betametasona em sua composição.
Os relaxantes musculares que podem ser prescritos na Odontologia, a exemplo do Miosan, Mioflex, Miorrelax e Dorflex, são permitidos no esporte.
Os anestésicos locais desde 2011 não são considerados doping. Porém, deve-se saber que a lista da WADA é publicada anualmente, no mês de janeiro de cada ano corrente, valendo sempre sua checagem.

Os medicamentos proibidos pela WADA não devem ser prescritos para os atletas profissionais, salvo em situações nas quais o atleta esteja afastado das competições ou em outros contextos em que ele faça algum tipo de tratamento para uma patologia e imponha a utilização específica de determinado fármaco. Nesses casos, o atleta deve obter uma Autorização de Uso Terapêutico (AUT) junto ao seu médico e comprovar a necessidade da utilização desse medicamento para fins terapêuticos, perante as instituições responsáveis pelo controle antidoping. Vale também lembrar que a necessidade da prescrição deve ser discutida e/ou informada a Equipe Médica responsável pelo atleta. Esta atitude minimiza os possíveis danos que uma prescrição equivocada acarretaria. O atleta profissional poderá sofrer sérias punições até em âmbito judicial, se comprovado que fez a ingestão de algum medicamento proibido mesmo que receitado pelo cirurgião-dentista, podendo até ser banido do esporte. Além das consequências jurídicas que o próprio profissional da Odontologia ficará sujeito.

A abordagem terapêutica do cirurgião-dentista deve ir além do conhecimento teórico-farmacológico. É de grande valia que o cirurgião-dentista faça uma anamnese minuciosa para entender o perfil, as características, hábitos, rotina, condições sistêmicas, entre outras informações do paciente/atleta.

É importante que o cirurgião-dentista tenha um conhecimento aprofundado em terapêutica medicamentosa, para que possa orientar e conscientizar o paciente/atleta quanto aos fármacos que podem acusar doping positivo e, desse modo, garantir a integridade física, psicológica e a saúde geral do atleta. Além disso, é fundamental que o C.D. conheça quais medicamentos não devem ser administrados para atletas profissionais e esteja atualizado em relação à lista da WADA, com vistas a evitar possíveis punições por doping e prejuízos à carreira do paciente/atleta.

Para reforçar a importância desse conhecimento registra-se abaixo o site da WADA para consultas e informações adicionais.

 https://www.wada-ama.org/en/what-we-do/the-prohibited-list

Figura 1: Biotransformação da codeína em morfina.

 

Referências 

Berard LT, Monteiro FS, Yonamine M, Dias RB, Coto NP. Doping na Odontologia do Esporte. Revista da Associação Paulista dos Cirurgiões Dentistas. 2020;74(2):109-13.

Bouso, José C., et al. Quality of Life, Mental Health, Personality and Patterns of Use in Self‐Medicated Cannabis Users with Chronic Diseases: A 12‐Month Longitudinal Study. Phytotherapy Research. 2020;34(7):1670-1677.

Martins M, Silva TO, Viana Filho FAC, Jov RA, Lima DLF. Medicamentos de uso odontológico considerados proibidos pela Agência Mundial Anti-Doping (WADA). Coleção Pesquisa em Educação Física. 2013;12(2):95-102.

The World Anti-Doping Agency. World anti-doping code 2015. 

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