

Resultados do primeiro Meeting de COMsenso: Endodontia
Confira um guia prático para o cirurgião-dentista
Emerson Nakao
Rodolfo Francisco Haltenhoff Melani
No mês de março foi realizado o Meeting de COMsenso Odontoprev, com o objetivo de discutir os critérios de análise dos tratamentos com cinco especialistas da rede credenciada. Nessa edição, abordamos a especialidade Endodontia. Foi o primeiro encontro de uma série de quatro previstos para este ano. A palavra “senso” refere-se à capacidade de entender e julgar, além de caracterizar a prudência e a lucidez de uma pessoa. É um substantivo masculino que indica a tendência de avaliar situações de forma sensata. O termo “consenso” designa um acordo generalizado feito por um grupo de pessoas, concordando com uma decisão, ideia ou direcionamento quanto a uma ação.
É uma técnica de tomada de decisão que busca o consentimento de todos os participantes, em vez de depender de votos majoritários ou comandos autorizados.
O objetivo principal desse evento é o de encurtar a distância com a rede credenciada. Para isso, foram programadas cinco reuniões de consenso, começando pela especialidade de Endodontia. Após uma breve explicação aos convidados, a maneira como é realizada a análise dos tratamentos endodônticos foi demonstrada, esclarecendo-se que ela é baseada na interpretação de imagens radiográficas, o que explica a grande importância da qualidade que elas apresentam. Por meio delas é possível inferir a indicação e a qualidade do procedimento, no que diz respeito ao acesso cirúrgico à câmara pulpar, adequadas dimensões da instrumentação do sistema de canais (profundidade, diâmetro e formato), e sua obturação. Assim, é natural que os critérios sejam baseados no que é possível reconhecer nas imagens radiográficas, e no que é (ou não) informado nas guias de tratamento.
Na tabela a seguir, há um resumo dos critérios utilizados na análise de tratamentos endodônticos, seguidos de comentários.
CRITÉRIOS UTILIZADOS NA ANÁLISE DE TRATAMENTOS ENDODÔNTICOS

A análise dos princípios de indicação, oportunidade e viabilidade é feita de forma indireta, ou seja, são utilizadas as informações contidas no prontuário eletrônico do beneficiário, como imagens radiográficas, fotográficas, relatos dos cirurgiões-dentistas e eventos registrados em seu histórico. São avaliados pela imagem radiográfica compatível com envolvimento pulpar irreversível e da possibilidade de reabilitação, direta ou indireta, do elemento em questão. O fator mais relacionado a esse critério é o comprometimento estrutural do dente, que pode ter sua origem em uma lesão de cárie extensa ou em uma fratura coronária que de alguma forma atinja a região da polpa do dente. Existem casos em que, mesmo não havendo um comprometimento estrutural do dente com envolvimento pulpar, pode-se fazer necessário o tratamento endodôntico. Isso ocorre quando o dente apresenta uma imagem compatível com rarefação óssea na região do periápice (lesão periapical), agudização de um processo inflamatório crônico preexistente, ou já não responde mais aos testes de vitalidade pulpar. Como essa situação é clínica, deve ser informada no campo de observações da GTO.

Saber se o tratamento ou retratamento será realizado em polpa morta ou viva, variações anatômicas na raiz ou calcificações no sistema de canais dá indicativos do comprimento de trabalho que pode/deve ser alcançado. A extensão de uma fratura dentária, as condições periodontais e o comprimento da raiz clínica (a parte da raiz inserida em osso alveolar) nos permitem estimar a viabilidade do tratamento: caso essas medidas/condições periodontais sejam postas em dúvida pela imagem radiográfica, talvez não valha a pena optar pela reabilitação do dente, mas considerar sua extração.
Pela radiografia, ainda é possível avaliar o grau de dificuldade da instrumentação de canais pelo formato sugerido da cirurgia de acesso (câmara pulpar). Quando as concrescências não são totalmente removidas, o que libera a entrada dos canais, o cirurgião-dentista pode encontrar dificuldades na introdução da lima endodôntica, correndo o risco de provocar algum desvio, um degrau, principalmente em condutos que tenham alguma curvatura, o que tornaria o processo bem mais complicado, ou até mesmo inviabilizando a chegada ao ápice.
A instrumentação dos canais deve sugerir um alargamento do formato original, em formato cônico de base maior iniciando na sua entrada na câmara pulpar. A conicidade facilita a inserção do cone obturador e do extravasamento do excesso de cimento e ar (bolhas) durante a obturação e a condensação, o que ajuda a evitar falhas no processo.
O tratamento do canal radicular é um procedimento confiável que visa restaurar ou manter a saúde dos tecidos apicais para manter o funcionamento dos dentes pelo maior tempo possível. No entanto, a falha do tratamento foi relatada em aproximadamente 15% a 25% dos casos, dependendo se critérios estritos ou vagos são usados para avaliar o tratamento. De qualquer forma, a infecção bacteriana persistente é apontada como a principal causa. Outras razões que podem levar ao fracasso do tratamento do canal radicular estão relacionadas a erros de procedimento, como preparação inadequada do comprimento de trabalho e/ou obturação, ou, mais especificamente, perfurações e fraturas do instrumento que impedem a cicatrização, comprometendo o resultado do tratamento. A prevalência global de periodontite apical em dentes tratados endodonticamente é de 39%.1
Idade do paciente2 e localização do dente no arco são outros dois fatores apontados na literatura como possíveis dificultadores.3 A formação gradativa de dentina terciária no interior da câmara pulpar ao longo dos anos, como resposta adaptativa aos estímulos térmicos, mecânicos e químicos, pode impossibilitar o acesso à entrada de um ou mais canais radiculares. E, quanto mais posterior o dente, maiores as dificuldades de acesso e instrumentação, além da própria anatomia radicular dos dentes.
Por fim, no que se refere à questão do limite apical para o material obturador, a literatura concorda e considera aceitável que a obturação esteja 2 mm aquém e 3 mm além do ápice.4,5
Com base nesses critérios técnicos, os participantes do Meeting analisaram casos de tratamentos endodônticos (sem identificação de autoria) enviados pela rede credenciada, para um melhor entendimento das dificuldades e do uso prático das informações contidas na tabela apresentada. Ao final dessa interação, uma discussão a respeito dessa atividade foi conduzida, seguida de uma votação destinada a aprovar ou não os critérios de análise. Como resultado, houve 100% de concordância.
Ficou entendido que a qualidade das imagens enviadas é um fator crucial na análise de tratamentos, principalmente porque a maior parte das glosas ocorre por erro administrativo: não envio de imagens (radiografias inicial e/ou final) ou falta de qualidade da radiografia enviada (corte do ápice, falta de contraste e nitidez, falha no processamento). E que informações adicionais (um relatório clínico) também podem contribuir para melhorar a comunicação.
Enquanto esta edição da revista estava sendo preparada, em maio, foi realizado o segundo Meeting de COMsenso Odontoprev, abordando a especialidade de Prótese Dentária. Na próxima edição, serão publicados os critérios técnicos discutidos.

REFERÊNCIAS:
1. Olivieri JG, Encinas M, Nathani T, Miró Q, Duran-Sindreu F. Outcome of root canal retreatment filled with gutta-percha techniques: A systematic review and meta-analysis. J Dent. 2024 Mar;142:104809. doi: 10.1016/j. jdent.2023.104809. Epub 2023 Dec 24. PMID: 38145805.
2. Frisk F, Hakeberg M. A 24-year follow-up of root filled teeth and periapical health amongst middle aged and elderly women in Göteborg, Sweden. Int Endod J. 2005 Apr;38(4):246-54. doi: 10.1111/j.1365-2591.2005.00944.x. PMID: 15810975.
3. Allen RK, Newton CW, Brown CE Jr. A statistical analysis of surgical and nonsurgical endodontic retreatment cases. J Endod. 1989 Jun;15(6):261- 6. doi: 10.1016/S0099-2399(89)80221-3. PMID: 2592882.
4. Malagnino VA, Pappalardo A, Plotino G, Carlesi T. The fate of overfilling in root canal treatments with long-term follow-up: a case series. Restor Dent Endod. 2021 Apr 29;46(2):e27. doi: 10.5395/rde.2021.46.e27. PMID: 34123763; PMCID: PMC8170384.
5. Krikeli E, Lambrianidis T, Molyvdas I, Mikrogeorgis G. Retrospective radiographic study comparing unintentional extrusion of gutta-percha versus sealer on teeth with periapical radiolucency. Quintessence Int. 2024 Aug 30;55(7):530-538. doi: 10.3290/j.qi.b5465309. PMID: 38874210.
ARTIGOS RECOMENDADOS:
• Huang D, Wang X, Liang J, Ling J, Bian Z, Yu Q, et al. Expert consensus on difficulty assessment of endodontic therapy [Internet]. Int J Oral Sci. 2024 Mar 1;16(1):22. doi: 10.1038/s41368-024-00285-0. PMID: 38429281; PMCID: PMC10907570 [citado 2025 jul 05]. Disponível em: https://www.ncbi.nlm. nih.gov/pmc/articles/PMC10907570/.
• Yousuf W, Khan M, Mehdi H. Endodontic procedural errors: frequency, type of error, and the most frequently treated tooth [Internet]. Int J Dent. 2015;2015:673914. doi: 10.1155/2015/673914. Epub 2015 Aug 10. PMID: 26347779; PMCID: PMC4546974 [citado 2025 jul 29]. Disponível em: https:// www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC4546974/pdf/IJD2015-673914.pdf.
• Bhuva B, Ikram O. Complications in Endodontics. Prim Dent J. 2020 Dec;9(4):52-58. doi: 10.1177/2050168420963306. PMID: 33225854.
• Hegde V, Mookhtiar H, Khan U, Shaikh K, Sayyed E, Shamani M, et al. Obturation errors: causes, consequences, and prevention in endodontics [Internet]. Int J Multidiscip Res. 2024 Nov–Dec;6(6):1–17 [citado 2025 jul 29]. Disponível em: https://www.ijfmr.com/papers/2024/6/30863.pdf.

Prof. Emerson Nakao
Mestre e Especialista em Prótese Dentária e professor da FFO-Fundecto, fundação conveniada à Faculdade de Odontologia da Universidade de São Paulo (FOUSP)

Prof. Dr. Rodolfo Francisco Haltenhoff Melani
Professor titular do Departamento de Odontologia Social e responsável pela área de Odontologia Legal do Programa de Pós-Graduação em Ciências Odontológicas, ambos na FOUSP