A relação do sono com a DTM

Estudo aponta que a duração do sono tem um impacto no sucesso do tratamento da disfunção temporomandibular

Boas noites de sono estão associadas ao bem-estar físico e mental, é o que diz o senso comum e o que atestam inúmeros estudos científicos. Descobre-se, agora, graças a uma pesquisa realizada na Universidade Nacional de Seul, na Coreia do Sul, que dormir na dose certa — em termos de qualidade e duração — também ajuda no tratamento de longo prazo da disfunção temporomandibular (DTM), que causa dor e prejudica o movimento da mandíbula. A condição é o segundo maior motivo de queixas por incômodos na região da boca, do rosto e do pescoço, atrás apenas da campeã dor de dente. Além da própria dor articular e nos músculos ao redor, a DTM geralmente vem acompanhada de outros sintomas, como cefaleia, alterações nas funções do ouvido e distúrbios do sono. Em outros estudos, 90% dos pacientes com DTM relataram dificuldade para dormir bem, um problema também associado a maiores níveis de dor na ATM (articulação temporomandibular). Ou seja, o sono de má qualidade é ao mesmo tempo causa e efeito da disfunção temporomandibular.

Tendo como base esse background, os pesquisadores Yibee Kim, Chunghwan Son, Yoon Kyung Park, Jung Hwan Jo e Ji Woon Park partiram para uma abordagem mais prática e procuraram entender o que muda quando tratamentos conhecidos para DTM são aplicados a pacientes com diferentes padrões de sono.

Para isso, eles separaram 63 pacientes, todas do sexo feminino com cerca de 20 anos de idade, que procuraram a clínica com sintomas de DTM, em três grupos: aquelas com sono curto (que dormem em média menos de 6 horas por noite), com sono normal (entre 6 e 8 horas por noite) e com sono longo (8 horas ou mais).

As participantes também foram divididas em grupos de alta e baixa incapacidade de acordo com a escala graduada de dor crônica. Todas receberam tratamentos conservadores para disfunção temporomandibular, que incluíam a correção de hábitos funcionais, fisioterapia com compressa quente úmida, aplicação de tala de estabilização oclusal com cobertura total dos dentes superiores, ultrassom e estimulação elétrica, medicação com analgésico, entre outros, e passaram a ser acompanhadas mensalmente ao longo de seis meses.

Para avaliar a efetividade do tratamento de acordo com o padrão de sono das pacientes, foram avaliadas mudanças em fatores como a intensidade da dor, a abertura confortável e a abertura máxima da boca e a presença de dor ao abrir a boca. Os pesquisadores também procuraram compreender a relação entre a qualidade do sono e outras variáveis normalmente associadas ao agravamento da DTM, como nível de estresse e um quadro de inflamação sistêmica. Para isso, foram coletadas amostras de sangue com o objetivo de verificar os níveis de hormônios relacionados ao estresse e de proteínas pró e anti-inflamatórias.

Também foram aplicados questionários para avaliar o grau de incidência de depressão, ansiedade e estresse nas pacientes, pois a literatura especializada sugere que distúrbios psicológicos crônicos aumentam a sensação de dor. Foi a primeira vez, contudo, que um estudo investigou a relação entre estresse psicológico, aumento da dor e qualidade e quantidade de sono em pacientes com DTM.

SONO CURTO É MAU NEGÓCIO

Os resultados iniciais confirmaram a associação entre a duração do sono e o grau de gravidade da DTM. Por exemplo, um número significativamente menor de pacientes que dormiam em média oito ou mais horas por noite relataram dor no movimento de protrusão mandibular, ou seja, quando se desloca a mandíbula para a frente. Com baixa significância estatística, descobriu-se também que as integrantes do grupo do sono longo sentiam menos dor ao mexer a mandíbula lateralmente e ao abrir a boca, além de terem maior amplitude nesse movimento. Os índices de depressão e de dor corporal generalizada, entre outras comorbidades, eram mais acentuados e presentes entre as pacientes de sono curto (menos de 6 horas por noite), o que confirma uma maior tendência de somatização de condições psiquiátricas nesse grupo. Em contraste, a presença de hormônios do estresse no sangue era significativamente menor nas pacientes que dormiam bastante. Esses resultados eram condizentes com o que revelaram estudos anteriores.

O que chamou a atenção dos cientistas foi a resposta de cada grupo de sono aos tratamentos para DTM no longo prazo. Em três critérios clínicos — intensidade da dor, abertura confortável da boca e dor na abertura da boca — houve melhoria significativa nos três grupos. Mas a redução na intensidade da dor entre pacientes com sono curto foi menor do que entre aquelas com duração normal e longa de sono. Foi inclusive registrado um aumento no nível de mediadores inflamatórios no sangue nas pacientes do grupo de sono curto após os seis meses.

Além disso, entre as pacientes que dormiam pouco, algumas funções mandibulares pioraram mesmo após completado o período de tratamento. É o caso da abertura máxima da boca, cuja amplitude em média se tornou menor nesse grupo. Os autores afirmam também que identificaram pela primeira vez que níveis mais altos de quatro tipos de interleucinas são um fator suficientemente forte para prever melhorias significativas na dor por DTM em tratamentos de longo prazo. As interleucinas participam da modulação da resposta inflamatória, seja intensificando-a, seja inibindo-a, a depender das circunstâncias.

A DOSE CERTA

O cruzamento dos dados coletados pelos pesquisadores também permitiu chegar a um resultado curioso, nem um pouco óbvio: dormir muito talvez não seja a melhor estratégia para combinar com um tratamento para DTM. Isso porque, no longo prazo, o sono longo reduz demais a ativação do sistema neuroendócrino, que regula a resposta do organismo ao estresse. Os níveis bem mais baixos do neurotransmissor norepinefrina, que possui importante papel de inibidor da dor, nas pacientes de sono longo chamaram a atenção dos autores do estudo. Eles sugerem que novas pesquisas sejam feitas para entender melhor essa dinâmica, inclusive para testar a hipótese de que os baixos níveis de norepinefrina seja justamente o que leva esse grupo de pessoas a dormir por mais tempo.

Ainda assim, com base no que conseguiram atestar, os pesquisadores sul-coreanos propõem um padrão de 6,5 horas de sono por dia como nota de corte para contribuir com a eficácia de um tratamento inicial de longo prazo contra a disfunção temporomandibular. “A duração do sono pode desempenhar um papel significativo no prognóstico de longo prazo da DTM e na resposta ao tratamento. Esses resultados sugerem a importância de identificar a quantidade de sono e os problemas relacionados no grupo de pacientes com DTM”, concluem os pesquisadores. Ou seja, o gerenciamento eficaz da duração do sono pode ser um importante aliado no tratamento bem-sucedido da DTM. Isso significa que é preciso dormir na dose certa para ter uma mastigação saudável.

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8. Busato ALS (Coord.). Dentística: filosofia, conceitos e prática clínica. Grupo Brasileiro dos Professores de Dentística. São Paulo: Artes Médicas, 2005.

Prof. Dr. Fernando S. Hanashiro

Cirurgião-dentista, Mestre e Doutor em Dentística

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