Bruxismo em Odontopediatria: considerações atuais

Adriana de Oliveira Lira

Uma das queixas constantes na clínica da Odontopediatria é a que a criança range os dentes durante o sono. Bruxismo é um termo que define vários tipos de movimentos involuntários da mandíbula, que pode acontecer com a criança acordada (bruxismo da vigília) e/ou com a criança dormindo, denominado de bruxismo do sono (BS). Na infância, o BS é mais frequente que o da vigília e as crianças apresentam mais do que os adultos.

O atrito entre os dentes durante o sono determina um ruído característico, que chama atenção de cuidadores e familiares e o relato deste sinal por terceiros é imprescindível para o diagnóstico do BS. Além de provocar desgaste dentário, que é irreversível, o ranger de dentes aparece associadas a quadros de Disfunção Temporomandibular (DTM), mas a ocorrência concomitante das situações não caracteriza uma relação causa e efeito. Nesse ponto, é importante ressaltar que “bruxismo não é DTM” uma vez que as situações são frequentemente confundidas. Enquanto bruxismo se refere às atividades musculares, o termo DTM conceitua situações clínicas caracterizadas principalmente por dor, som, e alteração da função mandibular. Nem todo paciente que apresenta bruxismo tem DTM e vice-versa.

Figura 1 – Desgaste dentário característico em quadros de BS

De acordo com a origem, o bruxismo pode ser primário ou secundário. No caso de BS primário, a etiologia é idiopática e no BS secundário a causa está relacionada com questões ambientais, apesar de haver uma influência genética comprovada. Uma das situações mais frequentes que pode iniciar ou exacerbar o movimento mandibular é a obstrução das vias aéreas superiores, que ocorre em casos de rinites, sinusites e apneia do sono. Além disso, a diminuição do pH esofagiano, típico dos quadros de refluxo gastroesofágico aumenta o movimento mandibular. Nos casos em que o paciente tem BS e refluxo, o desgaste dentário é mais acentuado por haver dois fatores de agressão aos dentes. Uso de substâncias psicotrópicas e medicações com ação central podem ser moduladores, aumentando ou amenizando o BS, o que reforça o entendimento de que o bruxismo é de ação central e não periférica. Alterações neurológicas associadas ou não a síndromes genéticas, igualmente aparecem como condições causais.

O estresse, apontado por muito tempo como fator causador, hoje em dia é visto como uma situação que aparece concomitante ao BS, mas não como fator etiológico direto. No caso da contração tônica, mais característica do BV, os fatores psicossociais como ansiedade, são mais plausíveis como etiológicos.

Um dos pontos importantes a ser destacado é a ausência de associação entre bruxismo e fatores oclusais. Por muito tempo se pensou que contatos prematuros e más oclusões causavam bruxismo, mas após a execução de pesquisas bem delineadas e com emprego de recursos como polissonografia, ficou claro que o início do movimento mandibular é no sistema nervoso central e que estruturas periféricas como músculo e dentes não têm nenhuma influência.

Ao receber uma criança com bruxismo, o odontopediatra precisa identificar fatores associados presentes e referenciar o paciente para o profissional que cuide do provável fator causal. A abordagem transdisciplinar é necessária. Cabe ao cirurgião-dentista e promover proteção dentoalveolar. Para isso, dispositivos interoclusais, conhecidos como placas de bruxismo.

Quando utilizadas em crianças e adolescentes, as placas ficam desajustadas após certo período de uso, reforçando o potencial genético do crescimento craniofacial nessas situações. Após a instalação, é importante que o profissional faça o acompanhamento clínico para ajustes e adequações da placa em relação às mudanças oclusais que ocorre nessa faixa etária.

Figura 2 – Alívio no acrílico para evitar que a irrupção dos permanentes desajuste a placa.

 Sendo o benefício mais importante da placa proteger os tecidos dentários a indicação da placa se faz mais precisa a partir do momento que a criança exibe contatos dos incisivos anteriores e primeiros molares permanentes. Na dentadura decídua não existe justificativa biológica para a indicação da placa.

Em relação à aplicação da toxina botulínica é importante deixar claro que esse tipo de abordagem não deve ser considerada por conta de alguns aspectos fundamentais. Mesmo após a aplicação o paciente continua mantendo a frequência e o tempo do ranger de dentes. A força do músculo diminui, mas isso não evita os contatos dos dentes e, portanto, não dispensa o paciente do uso das placas de proteção. O tempo de bruxismo é indefinido e, mesmo que a toxina fosse um tratamento válido, não se pode submeter o paciente à muitas aplicações visto que essa substância causa atrofia muscular e perda da qualidade óssea.

Assim, pode-se constatar que a criança com bruxismo deve ter uma atenção ampla, e a investigação de fatores adversos presentes se torna necessária e o conhecimento das informações sobre o tema deve ser sempre reciclado, considerando-se que o bruxismo é o objetivo de importantes pesquisas na atualidade. 

REFERÊNCIAS

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