

Como lidar com casos de alveolite
Confira um guia prático para o cirurgião-dentista
A exodontia é um dos procedimentos mais comuns na prática odontológica, sendo essencial na remoção de dentes comprometidos, com foco na saúde bucal do paciente. Quando realizada com técnica adequada e respeitando os princípios fundamentais, o índice de complicações é relativamente baixo.1 No entanto, a alveolite é uma das principais complicações que podem ocorrer após uma exodontia, especialmente em terceiros molares inferiores. Essa condição merece atenção devido ao desconforto que causa ao paciente e à necessidade de intervenção clínica adequada para prevenir complicações adicionais.
INCIDÊNCIA E FATORES DE RISCO
A incidência de alveolite varia de 0,5% a 5% em exodontias gerais,2 podendo atingir até 20% em casos de remoção de terceiros molares impactados.3 Determinados fatores podem aumentar significativamente o risco de ocorrência, incluindo:
- Hábitos pessoais: pacientes fumantes apresentam maior risco devido à diminuição da vascularização local e aos efeitos tóxicos do tabaco sobre a reparação alveolar.4
- Higiene bucal comprometida: a presença de biofilme dental contribui para o risco de infecções e complicações locais.
- Uso de anticoncepcionais orais: alteram os níveis hormonais e podem comprometer o processo de reparação.
- Fatores técnicos: traumas cirúrgicos extensos, tempo operatório prolongado e quebra na cadeia asséptica também são fatores relevantes.
- Fatores sistêmicos: a diminuição da capacidade imunológica devido a doenças sistêmicas (anemias), metabólicas (diabetes), entre outras, assim como um tratamento farmacológico prolongado com corticosteroides, favorece o desenvolvimento da alveolite.6
Geralmente, a alveolite se manifesta entre 48 e 72 horas após a extração, sendo essencial o acompanhamento clínico próximo nos primeiros dias.
CLASSIFICAÇÃO: ALVEOLITE SECA E GRANULOMATOSA
A alveolite pode ser classificada em dois tipos principais: seca e granulomatosa. A alveolite seca, também conhecida como “dry socket”, caracteriza-se pela ausência de coágulo sanguíneo no alvéolo, resultando em exposição óssea e dor intensa. Já a alveolite granulomatosa ocorre devido à presença de tecido de granulação infectado no alvéolo, frequentemente associada a infecções secundárias. Embora os dois tipos provoquem dor e desconforto, a abordagem clínica de ambos é distinta, o que torna essencial identificar corretamente o tipo para determinar o tratamento mais eficaz.3
DIAGNÓSTICO
O reconhecimento precoce dos sinais e sintomas é fundamental para iniciar o tratamento adequado e minimizar o desconforto do paciente. Entre os principais sinais e sintomas, destacam-se:
- Dor intensa e persistente: geralmente localizada no alvéolo, mas que pode irradiar para regiões adjacentes, como ouvido, mandíbula e região temporal.
- Exposição do osso alveolar: visível na inspeção clínica.
- Halitose e gosto desagradável: devido à presença de tecidos necróticos ou infecção secundária.
- Ausência do coágulo sanguíneo: um dos sinais clássicos da alveolite seca.
- Edema e linfadenopatia: mais comuns em casos severos ou quando há infecção associada.
O diagnóstico é essencialmente clínico, baseado na inspeção visual e no relato do paciente.

COMPLICAÇÕES SECUNDÁRIAS
Se não tratada adequadamente, a alveolite pode levar a complicações graves como:
- Infecções secundárias que exigem intervenções mais invasivas.
- Osteomielite local.
- Desconforto prolongado e comprometimento significativo da qualidade de vida do paciente.
Portanto, é crucial que o cirurgião-dentista atue de maneira proativa no manejo da condição.
PROTOCOLO DE MANEJO CLÍNICO
O manejo eficaz da alveolite requer uma abordagem estruturada, focada no alívio da dor e na prevenção de infecções secundárias. O protocolo pode ser dividido em:
1. Higienização do alvéolo
- Realizar irrigação suave com solução salina ou clorexidina a 0,12%.
- Remover detritos e tecidos necrosados com instrumental estéril.
2. Aplicação de curativo local
- Para alveolite seca: após irrigação, se necessário, utilizar pastas alveolares, como óxido de zinco com eugenol, para proteger o alvéolo e aliviar a dor. Esses curativos promovem alívio sintomático imediato e ajudam na proteção da área exposta. No entanto, eles retardam o processo de reparação alveolar. Pastas à base de própolis e iodofórmio também são utilizadas.
- Para alveolite granulomatosa: realizar desbridamento minucioso, removendo tecidos desorganizados, infectados ou de granulação. Após a limpeza, considerar o uso de curativos contendo agentes antimicrobianos para controlar a infecção subjacente. Pode ser realizada a terapia fotodinâmica (aPDT) para o controle da infecção local.
3. Controle da dor
- Avaliar a necessidade de bloqueio anestésico local em casos de dor intensa.
- Prescrever analgésicos sistêmicos, como dipirona e paracetamol.
4. Tratamento farmacológico
- Anti-inflamatórios não esteroidais podem ser prescritos para reduzir a inflamação.
- Antibóticos devem ser indicados em casos de alveolite granulomatosa com sinais claros de infecção secundária ou em pacientes imunossuprimidos.5
ACOMPANHAMENTO E ORIENTAÇÃO AO PACIENTE
Um acompanhamento rigoroso é indispensável para garantir a resolução do caso e prevenir recorrências:
- Realizar consultas de reavaliação a cada 48-72 horas. Se não tratada adequadamente, a alveolite pode levar a complicações graves
- Ajustar os curativos e a medicação conforme a evolução do caso.
- Orientar o paciente sobre cuidados específicos, como evitar sucção, mastigação no lado afetado e tabagismo durante o período de recuperação.
- Confirmar a completa reparação do alvéolo antes de finalizar o caso.
PREVENÇÃO: REDUZINDO OS RISCOS
Prevenir a alveolite é sempre o melhor caminho. Para isso, o cirurgião-dentista deve:
Na anamnese
- Identificar fatores de risco, como tabagismo e uso de medicamentos.
- Esclarecer o histórico odontológico e cirúrgico do paciente.
Durante o procedimento
- Garantir assepsia adequada do campo operatório.
- Minimizar traumas cirúrgicos, utilizando técnicas que minimizem o trauma local visando preservar os tecidos adjacentes.
- Orientar o paciente sobre cuidados pós-operatórios, como evitar bochechos vigorosos, evitar consumir alimentos com grãos, evitar sucção, consumir alimentos pastosos gelados nas primeiras 48 horas, não fumar.
- Prescrever antissépticos orais para uso imediato após a cirurgia, manter o local limpo.
- Aplicação de gel de clorexidina no alvéolo após a exodontia.7
Com essas medidas, é possível reduzir significativamente a incidência de alveolite e promover melhores resultados clínicos.
CONCLUSÃO
A alveolite é uma complicação comum, mas evitável, da exodontia. O manejo adequado, com uma abordagem baseada em
evidências, garante não apenas a resolução rápida da condição, mas também a satisfação do paciente. A prevenção, associada à intervenção precoce e à educação do paciente, é o alicerce para um atendimento de excelência.
REFERÊNCIAS:
1. Gregori C, de Campos AC. Cirurgia buco-dento-alveolar. 2 ed. São Paulo : Sarvier; 2004.
2. Rohe C, Schlam M. Alveolar Osteitis. 2023 May 29. In: StatPearls [Internet]. Treasure Island (FL): StatPearls Publishing; 2025 Jan–. PMID: 35881742.
3. Hupp JR, Ellis III E, Tucker MR. Cirurgia oral e maxilofacial contemporânea. 7 ed. Rio de Janeiro : Guanabara Koogan; 2021.
4. Kuśnierek W, Brzezińska K, Nijakowski K, Surdacka A. Smoking as a risk factor for dry socket: A systematic review. Dent J (Basel). 2022 Jul 1;10(7):121. doi: 10.3390/dj10070121. PMID: 35877395.
5. Camps-Font O, Sábado-Bundó H, Toledano-Serrabona J, Valmaseda-de- -la-Rosa N, Figueiredo R, Valmaseda-Castellón E. Antibiotic prophylaxis in the prevention of dry socket and surgical site infection after lower third molar extraction: a network meta-analysis. Int J Oral Maxillofac Surg. 2024 Jan;53(1):57-67. doi: 10.1016/j.ijom.2023.08.001. Epub 2023 Aug 21. PMID: 37612199.
6. Figueiredo Filho CWD, Santana MR, Sales PHH. Alveolitis as a complication of third molar extraction: a literature review. BJHR. 2023;6(6):30423- 32. doi:10.34119/bjhrv6n6-296.
7. Gumrukcu Z, Karabag M, Guven SE. The effects of chlorhexidine gel and tranexamic acid application after tooth extraction on the risk of alveolar osteitis formation: a double blind clinical study. Clin Oral Investig. 2024 Aug 21;28(9):494. doi: 10.1007/s00784-024-05886-x. PMID: 39167305.

Prof. Dra Mariana Aparecida Brozoski
Professora doutora de Cirurgia e Traumatologia Bucomaxilofacial da Faculdade de Odontologia da Universidade de São Paulo. Vice coordenadora do Programa de Residência em Cirurgia e Traumatologia Bucomaxilofacial do Hospital Universitário HU – USP

Prof. Dr Daniel Falbo Martins de Souza
Coordenador do Núcleo de Cirurgia e Traumatologia Bucomaxilofacial do Hospital Samaritano Paulista. Diretor do Centro de Treinamento Internacional IBRA no Hospital Samaritano Higienópolis