Pesquisa e Tendências

Impactos da perda dental no osso alveolar

Estudo de pesquisadores da FOP-Unicamp comprovou que a perda de um dente causa alterações mecânicas e biológicas no osso alveolar

Já se sabe, na Odontologia, que a perda de um dente modifica a oclusão e causa alterações no osso alveolar. Agora, um grupo de pesquisadores da Faculdade de Odontologia de Piracicaba, da Universidade Estadual de Campinas
(FOP-Unicamp), está estudando os tipos de estímulos mecânicos que podem ativar essa remodelação óssea. Eles conseguiram provar que existe uma relação entre as alterações mecânicas e biológicas causadas pela perda dentária.

A pesquisa foi realizada com apoio da Fapesp e faz parte da iniciação científica da estudante Beatriz Carmona Ferreira, sob orientação e coordenação da professora Ana Cláudia Rossi. Os resultados foram publicados na revista Frontiers in Physiology, em junho de 2020, por Rossi e seus colegas Felippe Bevilacqua Prado e Alexandre Rodrigues Freire.

Combinação de análises

Para realizar o teste, foi usado um modelo computacional desenvolvido pelo grupo de pesquisadores do Laboratório de Pesquisa em Mecanobiologia da FOP-Unicamp. “Nós trabalhamos com análise de elementos finitos por meio de simulação computacional. Neste caso, criamos um modelo virtual tridimensional do crânio e da mandíbula do rato com o dente extraído e aplicamos forças mastigatórias nele. Assim, foi possível avaliar as deformações mecânicas no osso”, explica Rossi.

Esse modelo é baseado em imagens microtomográficas da cabeça do animal. Para o estudo, foram usados ratos machos de dois meses de idade, que tiveram o dente incisivo superior direito extraído. “Como é um modelo virtual, é preciso incorporar informações dos tipos de tecido, da mordida do animal, da sua força muscular. Quanto mais informações forem incluídas, mais próximo da realidade o modelo fica”, explica Rossi.

A análise mecânica computacional foi então associada à análise imuno-histoquímica, que mostra a expressão de proteínas em tecidos. Foi assim que o grupo descobriu a ativação da proteína β-catenina no osso alveolar logo depois da perda do dente.
Embora existam estudos na literatura que associam a expressão dessa proteína a alterações mecânicas no tecido ósseo, o osso alveolar ainda não tinha sido estudado, segundo Rossi.

Embora existam estudos na literatura que associam a expressão dessa proteína a alterações mecânicas no tecido ósseo, o osso alveolar ainda não tinha sido estudado, segundo Rossi.

Distribuição da quantidade de deformações no grupo-controle (A) e no grupo experimental (B). A parte superior da figura mostra a escala geral de cores para a distribuição de deformações. A parte inferior mostra a escala de cores modificada configurada para a região do osso alveolar. A linha preta indica um plano de corte sagital, no qual o terço médio da região alveolar foi destacado no quadrado de borda preta (contendo o osso, o ligamento periodontal e o dente). Abaixo do quadrado, a lâmina óssea alveolar vestibular (b) e lingual (l) foram isoladas para melhor visualização. Observe que o grupo experimental apresentou distribuição uniforme de deformações de cor, sendo difícil identificar as estruturas na vista sagital. Ferreira et al, 2020.

Benefícios para o tratamento da perda dental

O resultado inédito prova que a perda de um dente causa deformações mecânicas no osso alveolar. Na prática, essa alteração pode sobrecarregar e enfraquecer os outros dentes e seus ossos de suporte. “O que conseguimos mostrar é que o dente vizinho do dente perdido teve sobrecarga mecânica, por isso a proteína se expressou no osso alveolar. E a deformação desse osso pode levar à perda dos dentes vizinhos”, diz Rossi.


Um dos objetivos do estudo é ajudar no planejamento de uma reabilitação oral adequada para cada paciente, que possa minimizar e evitar esses problemas. Nesse sentido, o grupo pretende seguir com os trabalhos e melhorar o modelo computacional para conseguir simular casos específicos. “Como eu sei que essa proteína se expressou no osso alveolar, e ela prediz uma alteração do ambiente mecânico do osso alterado, quando eu for simular no computador para um ser humano, conseguirei entender que naquela região ele precisa de um implante dentário com determinado material.”


Para isso, é preciso simular as características de cada um, em termos de alimentação, comportamento, genética e também estrutura óssea, dentária e muscular. “O objetivo é não precisar fazer o estudo nos animais, no modelo biológico, e conseguir fazê-lo direto no modelo computacional”, explica Rossi. Depois de avaliar e incluir dados mecânicos e biológicos, os pesquisadores querem coletar dados de propriedades físicas do osso, como rigidez e elasticidade.


A inclusão dessa nova camada de informações é um passo não só para aprimorar o modelo, mas também para permitir que ele seja usado para fazer a simulação dos tratamentos em ratos. “Queremos colocar implantes e próteses para estudar se a proteína também se expressa no osso alveolar. A ideia é ter mais dados sobre a ação da proteína, não só na situação de doença e de perda do osso”, afirma Rossi. Entender o comportamento biológico, mecânico e físico do osso de suporte dos dentes diante da perda dentária pode ajudar a prever o melhor tipo de material para implante. O resultado é uma reabilitação melhor e mais adequada.

VEJA MAIS:

Ferreira BC, Freire AR, Araujo R, Amaral-Silva GK, Okamoto R, Prado FB, Rossi AC. β-catenin and its relation to alveolar bone mechanical deformation – a study conducted in rats with tooth extraction. Front Physiol. 2020. doi: 10.3389/fphys.2020.00549.

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