Influência do tabagismo sobre as complicações peri-implantares

Marinella Holzhausen Caldeira, Aldrin André Huamán Mendoza

Marinella Holzhausen Caldeira- Professora Associada da Disciplina de Periodontia do Departamento de Estomatologia da Faculdade de Odontologia da Universidade de São Paulo.

Aldrin André Huamán Mendoza- Cirurgião-dentista, aluno de Mestrado em Ciências Odontológicas, Área de concentração em Periodontia da Faculdade de Odontologia da Universidade de São Paulo.

Figura 1 – Representação esquemática da relação entre os efeitos biológicos do tabagismo e as consequências clínicas sobre os implantes dentais. Figura elaborada com o software RioRender.com. 

O tabagismo é responsável pela morte prematura de mais de 150 mil pessoas a cada ano no Brasil. E, apesar dos avanços no controle do cigarro o tabagismo continua sendo uma séria questão de saúde pública no país com mais de 20 milhões de adultos que fumam todos os dias.

É sabido que o fumo causa exposição a mais de 7 mil substâncias tóxicas e carcinogênicas as quais podem danificar quase todos os órgãos do corpo humano e aumentar o risco de neoplasias e doenças do sistema cardiovascular e respiratório. Os efeitos deletérios do tabagismo sobre a saúde oral são evidenciados pelo aumento do risco de lesões cancerígenas orais, cáries radiculares e perdas dentais associadas à periodontite em pacientes fumantes quando comparado a não-fumantes. Além disso, o fumo pode levar a complicações na cicatrização pós-cirurgia oral e a um pior prognóstico para o tratamento periodontal.

Várias complicações relacionadas aos implantes dentais também têm sido associadas ao tabagismo (vide Figura 1). Os estudos científicos mostram um maior risco de falha de implantes e um aumento da perda óssea marginal em pacientes fumantes quando comparados aos não-fumantes. Interessante observar que os efeitos deletérios do tabagismo sobre o metabolismo ósseo parecem impactar de maneira mais acentuada a região da maxila a qual apresenta uma pior qualidade do osso trabeculado em comparação com a mandíbula.

Diferentes toxinas encontradas no tabaco (principalmente nicotina, monóxido de carbono e cianeto de hidrogênio) são citotóxicas e podem ter um impacto negativo sobre os processos biológicos associados com a osseointegração e a manutenção a longo prazo dos implantes, tais como: metabolismo ósseo, osteogênese, angiogênese e resposta imunológica.

O tabagismo causa alterações na composição da matriz óssea e piora a mineralização óssea, levando à fragilidade do osso. A maior predisposição dos fumantes a perda óssea pode ser explicada pelo efeito inibitório do tabagismo sobre a osteogênese e sobre o metabolismo ósseo, através da inibição dos osteoblastos e ativação de osteoclastos. Ainda, o tabagismo inibe diversos processos associados com a formação de novos vasos sanguíneos (angiogênese) importantes na osseointegração e na remodelação óssea ao redor dos implantes. Além disso, o fumo induz à vasoconstrição e ao aumento da adesão de plaquetas e, dessa forma, pode levar à uma pobre cicatrização e reparo tecidual.

Uma maior prevalência e maior severidade de lesões inflamatórias peri-implantares, tais como mucosite e peri-implantite também têm sido associadas com o tabagismo. Acredita-se que o aumento da inflamação e destruição dos tecidos peri-implantares em indivíduos fumantes possa estar associado a alterações importantes no número e na função de células-chave da defesa imunológica. Alguns estudos demonstraram ainda que o tabagismo pode alterar o microbioma peri-implantar levando ao crescimento de algumas espécies bacterianas mais patogênicas.

Interessante observar que o tabagismo tem efeito cumulativo sobre os tecidos peri-implantares, ou seja, o consumo excessivo de cigarros por um maior tempo está positivamente associado com a ocorrência e severidade de complicações clínicas nos implantes dentais.

Alguns dos efeitos deletérios do tabagismo sobre os tecidos peri-implantares podem ser reduzidos ou revertidos pela cessação do tabagismo. Dessa forma, o cirurgião dentista deve aconselhar seus pacientes fumantes a abandonarem o uso do cigarro.

Em conclusão, em virtude da alta taxa de perda dentária em fumantes, o aumento exponencial do uso de implantes na reabilitação oral destes indivíduos é uma realidade clínica atual. Assim, a orientação do paciente em relação aos efeitos do tabagismo sobre a saúde peri-implantar deve ser reforçada pelo clínico a cada fase do tratamento e o programa de manutenção deve ser individualizado com uma maior frequência e em intervalos mais curtos entre consultas

REFERÊNCIAS

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