Alinhadores e fluxo digital em ortodontia

Princípios básicos de cirurgia em odontopediatria

Ricardo De Nardi Fonoff, graduado em Odontologia pela Universidade de São Paulo (1989), mestrado em Odontopediatria pela Universidade de São Paulo (1998) e doutorado em Odontopediatria pela Universidade de São Paulo (2002). Tem experiência na área clínica, com ênfase em Odontopediatria, Cirurgia e Laser em Odontologia.

Jorge Abrão

Os princípios básicos que regem a cirurgia em odontopediatria são os mesmos que orientam a cirurgia bucal em adultos: medidas de assepsia e antissepsia, necessidade e oportunidade, diagnóstico correto, além de instrumentais e técnica adequadas. Entretanto, considerações adicionais em caso de crianças devem ser feitas:

– A criança encontra-se em fase de crescimento e desenvolvimento. Isso condicionará o diagnóstico com relação à necessidade e oportunidade cirúrgica, além de exigir do profissional, durante o ato operatório, cuidado especial ao intervir próximo a centros de crescimento e estruturas em desenvolvimento;

– Preparo psicológico da criança e dos pais. O diagnóstico da condição clínica que necessite de intervenção cirúrgica pode gerar uma situação de ansiedade na criança, nos pais e na família. Cabe ao odontopediatra que se propõe a realizar procedimentos cirúrgicos, estar ciente deste tipo de situação e realizar um condicionamento psicológico apropriado para o paciente infantil e seus pais. Esse cuidado evita que os adultos transmitam ansiedade e medo para a criança.

Além disso, nenhuma intervenção poderá ocorrer sem a permissão (por escrito) dos pais ou responsáveis, que deverão estar bem-informados sobre os procedimentos a serem realizados e as possíveis complicações. No manejo com a criança, é fundamental que o profissional tenha paciência, use sempre a sinceridade, seja compreensivo e ao mesmo tempo firme no controle da situação.

A maioria dos procedimentos cirúrgicos em Odontopediatra, com exceção das situações de urgência, é eletiva; portanto, permite que o paciente seja preparado para o procedimento. Cirurgias como remoção de dentes supranumerários ou frenectomias são realizadas, na maioria das vezes, na dentição mista, faixa etária onde é possível o entendimento da criança de sua situação clínica e a importância de sua colaboração para o sucesso da intervenção;

– Controle da dor. A anestesia eficaz é fundamental em qualquer intervenção cirúrgica. Na criança, uma anestesia incompleta é ainda mais crítica, pois a dor colocará a perder o condicionamento psicológico prévio. Tecnicamente, temos que lembrar que o tecido ósseo é menos calcificado e mais poroso, e que o forame mandibular na dentição decídua está localizado abaixo do plano oclusal (Figura 1). Na anamnese deve-se conhecer a experiência anterior da criança e o respectivo comportamento apresentado nesta intervenção.

Figura 1 – Diferença anatômica da localização do forame mandibular. Na dentição decídua, está localizado abaixo do plano oclusal

Condicionamento anestésico

Um dos fatores mais importantes para o êxito da cirurgia é o preparo da criança para a anestesia local. É fundamental que ela conheça a sensação anestésica antes do ato cirúrgico. Portanto, preconizamos que seja realizada uma consulta específica onde realizamos uma anestesia infiltrativa próxima à região a ser operada, fazendo que o paciente já tenha contato com o tipo de sensação que esta provoca. Dessa maneira, evitamos que na consulta da cirurgia propriamente dita, a criança possa ter uma reação inesperada por não conhecer o resultado de uma anestesia, podendo comprometer o ato cirúrgico.

Tal conduta é preconizada com crianças que nunca sofreram qualquer anestesia local ou que já foram anestesiadas há algum tempo e apenas para pacientes a partir de 5 anos de idade. Nesta faixa etária, espera-se uma reação mais positiva da criança em relação à sensação anestésica.

O condicionamento deve ser realizado da seguinte maneira: elege-se a área e procede-se a anestesia tópica seguida da anestesia infiltrativa vestibular com cerca de ¼ a ⅓ do conteúdo do tubete anestésico. Tal quantidade é suficiente para que a criança sinta parte do lábio anestesiado e cumpre o propósito de nossa conduta.

Na sessão de condicionamento anestésico, o paciente deve ser informado sobre a função da anestesia e suas vantagens, tais como o de permitir a realização da cirurgia sem que ela sinta qualquer desconforto. Naturalmente, não devemos falar ou fazer qualquer analogia com palavras como “injeção”, “agulha”, “picada”, mas sim, informar à criança que a anestesia vai permitir que a cirurgia possa ser realizada tranquilamente.

Paramentação

Como em qualquer outro procedimento cirúrgico, em Odontopediatria também lançamos mão de todas as medidas de biossegurança e paramentação do profissional e equipe auxiliar.

A organização da mesa cirúrgica é fundamental para que o procedimento ocorra com sucesso, pois isso faz com que o profissional tenha todo o instrumental a ser utilizado em mãos, diminuindo assim o tempo operatório e, consequentemente, uma possível ansiedade gerada no paciente (Figura 2).

Figura 2 – Organização da mesa cirúrgica é fundamental para o procedimento cirúrgico

Outro aspecto relevante da paramentação é quanto ao uso dos campos fenestrados, utilizados normalmente em cirurgia bucal. Como é um recurso que cobre o rosto da criança e impede a visualização do profissional e do ambiente, pode gerar uma situação de medo subjetivo, ou seja, do desconhecido.

O campo fenestrado estaria indicado apenas para crianças muito cooperadoras, que aceitem bem este recurso, mas com uma abertura um pouco maior, permitindo que a parte fenestrada comporte a cavidade bucal e os olhos da criança.

Considerações finais

As recomendações pós-operatórias devem ser explicadas detalhadamente ao responsável e de preferência dadas por escrito. Crianças na faixa etária escolar já podem receber as orientações num linguajar apropriado, sentindo-se assim também responsáveis pelo seu bem-estar.

Devemos nos colocar à disposição do paciente para qualquer eventual esclarecimento ou situação de urgência, caso seja necessário nos dias subsequentes à cirurgia, fornecendo um telefone de contato, além do número do consultório no horário comercial.

Referências bibliográficas

FONOFF, R.D.N.; HADDAD, A.E.; ALENCAR, C.J.F. CIRURGIA EM ODONTOPEDIATRIA.  In: Guedes-Pinto, AC Böneccker M, Rodrigues, CRMD. São Paulo: Ed Santos, 2009, p 277-299.

CORREA, M.S.N.P.; FONOFF, R.D.N. O CONDICIONAMNETO PSICOLÓGICO PARA CIRURGIA EM ODONTOPEDIATRIA. In: CORREA, M.S.N.P. Conduta Clínica e Psicológica na Odontopediatria. São Paulo: Ed Santos, 2013, p 279-290.

Rolar para cima