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Restauração de dentes com tratamento endodôntico

Carlos Alberto Kenji Shimokawa, professor doutor no Departamento de Dentística da FOUSP e orientador do Programa de Pós-Graduação em Odontologia (área de concentração: Dentística) da mesma Universidade.

Tais Scaramucci Forlin, professora associada do Departamento de Dentística da Faculdade de Odontologia da Universidade de São Paulo (Livre-docência em 2022). Atua como revisora de diversos periódicos nacionais e internacionais.

Jorge Abrão

Os tratamentos endodônticos são frequentemente associados a uma grande destruição do remanescente dental, que pode ser decorrente de lesões de cárie, desgaste dental excessivo ou de traumas dentais. A restauração de dentes com tratamento endodôntico comumente envolvia o uso de núcleo metálico fundido e coroas metalocerâmicas, mas com o avanço da adesão e dos tratamentos restauradores, esse tipo de tratamento tem sido cada vez menos utilizado.

A viabilidade e o prognóstico das restaurações feitas após o tratamento endodôntico devem ser considerados antes da escolha do tratamento restaurador. Assim, os aspectos relacionados à restauração desses dentes são fundamentais para o sucesso final do tratamento.

Um dos principais fatores a serem avaliados antes da restauração de dentes com tratamento endodôntico é o remanescente dental. Durante o tratamento endodôntico existe a necessidade da remoção de estrutura dental para a cirurgia de acesso, além do desgaste feito em decorrência do preparo do conduto durante o preparo químico cirúrgico, fragilizando o remanescente dental. Após o tratamento endodôntico, com o uso de agente irrigantes e medicamentos intracanal, ocorrem alterações nas propriedades dos dentes, em decorrência da diminuição de sua umidade, deixando-os mais friáveis e susceptíveis a fraturas.1

Figura 1 – Dente com mínima perda de estrutura e acesso endodôntico conservador, preconizado atualmente, havendo a possibilidade de ser reabilitado com uma restauração direta em resina composta

Ao analisar o remanescente dental, o cirurgião dentista deve se atentar não somente à quantidade de remanescente dental, mas também à qualidade desse remanescente (Figura 1). A quantidade de paredes remanescentes pode influenciar o sucesso do tratamento restaurador, mas o volume dessas paredes também deve ser considerado. Se as paredes remanescentes forem muito delgadas, ou se existirem trincas e fraturas, pode haver a necessidade de recobrimento de cúspides na confecção da restauração.   

A quantidade de remanescente dental também pode interferir na capacidade de retenção da restauração promovida por ele. Apesar do grande avanço da adesão e dos sistemas adesivos, existem algumas situações em que o remanescente dental não proporciona retenção suficiente para uma adequada restauração do dente. Assim, para aumentar a retenção, pode ser necessário o uso de retentores intra-radiculares.

É importante salientar que os retentores não reforçam a estrutura dental, somente servem para aumentar a retenção da restauração. Na verdade, se houver um preparo exagerado para a adaptação de retentores, pode haver um desgaste ainda maior do remanescente dental, que resultará em diminuição da resistência do dente.

Para o uso de retentores, deve-se considerar a direção na qual incidirão as forças mastigatórias. Forças axiais, no sentido do longo eixo do dente, como as que incidem comumente nos dentes posteriores, são mais favoráveis para a retenção da restauração do que cargas oblíquas, como as que incidem em dentes anteriores.

Figura 2 – Dente posterior apresentando perda de estrutura relevante, mas com a possibilidade de retenção adesiva na câmara pulpar, não havendo necessidade do uso de retentor intra-radicular

Além disso, dentes posteriores são mais facilmente restaurados sem o uso de retentores intra-radiculares do que os dentes anteriores, pois nesses casos pode-se buscar retenção para os preenchimentos através da adesão feita em sua câmara pulpar (Figura 2). De fato, a técnica restauradora sem a utilização de retentores intra-radiculares tem sido cada vez mais utilizada, havendo estudos que mostram menor probabilidade de fratura catastrófica do remanescente quando comparada ao uso de retentores.2

Com relação ao material do retentor intra-radicular, existe maior concentração de tensões no remanescente dental quando núcleos metálicos fundidos são utilizados e, consequentemente, maior probabilidade de fratura desse remanescente dental. O uso de pinos de fibra de vidro resulta em uma maior probabilidade de fratura do preenchimento ou do pino, mas gera menor risco de fratura radicular.3 Assim, atualmente, visando a diminuição do risco de fraturas radiculares, que não são passíveis de restauração, existe a preferência do uso de pinos de fibra de vidro.

Por outro lado, existe a preocupação com relação ao desgaste excessivo que pode ser gerado durante o preparo radicular para a adaptação do pino. Então, é preferível que se utilize um pino de menor diâmetro do que o do conduto radicular, e que esse pino seja reanatomizado com resina composta, para melhor adaptação e menor linha de cimentação, o que pode gerar menos tensões na interface de cimentação.4

Assim, antes mesmo do tratamento endodôntico, deve-se avaliar a viabilidade e as possiblidades restauradoras do elemento dental. Após o tratamento endodôntico, deve ser considerado que haverá maior fragilidade do dente e, portanto, deve ser ponderada a necessidade da utilização de retentores intra-radiculares e de restaurações indiretas, dependendo das cargas oclusais exercidas e da possibilidade de retenção do preenchimento na câmara pulpar do remanescente dental.   

Referências 

  1. Mannocci F, Bitter K, Sauro S, Ferrari P, Austin R, Bhuva B. Present status and future directions: The restoration of root filled teeth. Int Endod J. 2022 Oct;55 Suppl 4(Suppl 4):1059-1084.
  2. Carvalho MA, Lazari PC, Gresnigt M, Del Bel Cury AA, Magne P. Current options concerning the endodontically-treated teeth restoration with the adhesive approach. Braz Oral Res. 2018 Oct 18;32(suppl 1):e74.
  3. Santos AF, Meira JB, Tanaka CB, Xavier TA, Ballester RY, Lima RG, Pfeifer CS, Versluis A. Can fiber posts increase root stresses and reduce fracture? J Dent Res. 2010 Jun;89(6):587-91.
  4. Dal Piva AMO, Tribst JPM, Borges ALS, Bottino MA, Souza ROA. Do Mechanical Advantages Exist in Relining Fiber Posts with Composite Prior to its Cementation? J Adhes Dent. 2018;20(6):511-518.
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