TRANSIÇÃO DE

RESTAURAÇÕES ESTÉTICAS

SEM SOMBRAS

As técnicas, os cuidados e o passo a passo para minimizar o aparecimento de áreas sombreadas

Fernando Hanashiro

As restaurações estéticas feitas com material direto (resina composta) são os trabalhos mais comumente executados pelo cirurgião-dentista. Possuem um excelente custo-benefício e são muito menos invasivas do que as restaurações indiretas. Embora elas sejam comuns, a confecção das restaurações em dentes anteriores apresenta uma maior dificuldade, pois a restauração deve ser imperceptível em circunstâncias normais.

A maior dificuldade é a transição entre o dente e a restauração, local no qual, em algumas situações, podem ser observadas áreas sombreadas.

Para que a restauração tenha um bom resultado estético, um dos fatores mais importantes é a sua cor. Por definição, a cor é a interação entre luz, objeto e observador. Sendo assim, com a intenção de minimizar possíveis erros, a escolha de cor deve ser feita de maneira a seguir um protocolo:

1 – Luz. A escolha de cor deve ser feita sob luz branca, por conter o espectro de todas as cores;

2 – Objeto. O objeto deve ser submetido a profilaxia para que a escolha de cor não seja influenciada por possíveis contaminantes visuais;

3 – Objeto úmido. Para a escolha de cor, o objeto deve estar úmido, pois a sua desidratação altera a percepção de cor;

4 – Observador. É importante salientar que a escolha de cor pode ser influenciada pelo cansaço ou até mesmo pela utilização de alguns tipos de medicação.

A luz, ao incidir sobre uma superfície, tem como consequência três possíveis processos principais: reflexão, transmissão e absorção. Esses processos ocorrem em maior ou menor proporção e dependem do tipo e da composição do objeto:

Reflexão de luz: pode ser parcial ou total. A reflexão é total quando 100% da luz é refletida, como em um espelho, e é parcial quando uma parte é refletida e outra parte interage através do objeto.

Transmissão da luz: corresponde à possibilidade de objetos permitirem a passagem de luz, podendo variar de transparente ao opaco, passando ainda pela translucidez, como ocorre no esmalte e na dentina².

 Absorção de luz: corresponde à diminuição da intensidade da luz durante sua passagem pelo objeto.

Os processos físicos que ocorrem na interação da luz com os objetos são de suma importância, pois isso impacta no que ocorre com os tecidos dentais; e essas interações devem ser reproduzidas para que o material artificial utilizado na restauração possa reproduzir a estética dos tecidos dentais.

O esmalte dental tem como característica principal ser um tecido dental com translucidez, o que significa que a luz é parcialmente transmitida pelo tecido²³.

A dentina é um tecido dental cujas propriedades ópticas variam de acordo com a sua localização, isso devido à sua variabilidade no número de túbulos dentinários. No entanto, por ter uma composição química e estrutural diferente da do esmalte, este tecido apresenta uma menor translucidez quando comparado ao esmalte.

Atualmente, os materiais restauradores têm diversas apresentações, de acordo com sua translucidez e/ou opacidade. Os fabricantes comumente classificam suas resinas compostas em: resina composta de esmalte; resina composta de corpo; e resina composta de dentina.

Essa classificação está em ordem crescente de opacidade ou decrescente em sua translucidez.

A diferença na translucidez e opacidade é comparada quando consideramos a mesma espessura de material, pois, ao aumentarmos a espessura, diminuímos a sua translucidez⁴.

Para melhorar a estética, podemos executar no ângulo cavossuperficial vestibular um bisel, que consiste num pequeno desgaste de até 1mm de extensão.

Conhecendo as características dos tecidos dentais, podemos utilizar a técnica de estratificação de resinas compostas. Essa técnica consiste em uma sobreposição de diferentes camadas de resina composta com diferentes características ópticas, com a finalidade de reproduzir as características dos tecidos perdidos.

As técnicas de estratificação variam de acordo com o número de camadas e suas finalidades. Na literatura⁵ são descritos quatro tipos de técnicas:

Técnica clássica de duas camadas – utiliza-se uma camada com características semelhantes às do dente e, em seguida, uma camada incisal ou transparente para imitar a borda incisal⁶ de maior translucidez, esta baseada numa restauração monocromática que, em consequência, tem uma estética mais limitada. Essa técnica é mais indicada para restaurações classe III e classe V.⁵

Técnica clássica de três camadas – utilizam-se três camadas distintas de resina composta, uma resina de dentina opaca, uma resina de dentina de corpo e uma resina de esmalte. Essas camadas são colocadas em ordem crescente de translucidez, e apresentam-se policromáticas,⁵ ⁶ ⁷ com estética superior à da técnica de duas camadas. 

Técnica da estratificação natural – duas camadas – técnica proposta por Dietschi.⁸ Os tecidos a ser reparados são substituídos por resinas de propriedades ópticas semelhantes, de esmalte e de dentina, com espessuras semelhantes às dos tecidos perdidos. Esta técnica é semelhante à técnica clássica de duas camadas, mas tem como referência a espessura definida pelo tecido perdido. ⁶ ⁷

Técnica moderna de estratificação natural – três camadas – técnica semelhante à anterior, mas com a adição de efeitos ópticos para reproduzir alguns detalhes,⁶ como azul para opalescência, pigmentos localizados para aumentar a saturação de áreas específicas ou branco para áreas hipomineralizadas.

Para minimizar o aparecimento de áreas sombreadas, devemos então seguir estes passos:

1 – Fazer profilaxia previamente à escolha de cor;

2 – Escolher a cor do dente sob luz branca;

3 – Escolher a cor previamente ao preparo cavitário – a desidratação do dente altera a cor temporariamente;

4 – A escolha de cor não é necessariamente monocromática. Se for preciso, faça um mapeamento das cores do dente, identificando possíveis diferenças ao longo de sua superfície – cores diferentes no terço cervical, terço médio e terço incisal;

5 – Podemos confirmar a escolha de cor polimerizando pequenas quantidades de resina composta na superfície do dente – importante: não utilizar sistema adesivo para que possamos remover a resina de confirmação de cor facilmente;

6 – Fazer a confecção do preparo cavitário;

7 – Executar bisel no ângulo cavossuperficial vestibular;

8 – De acordo com a profundidade e a extensão do preparo cavitário, escolhemos a técnica de estratificação. Quanto maior profundidade e extensão, mais complexa deve ser a técnica de estratificação;
9 – Evitar o uso exclusivo de resina composta de esmalte. Devido a sua translucidez, a restauração pode transmitir parte da luz através da resina e ter menos reflexão da luz quando comparada com o resto dente, causando o sombreamento.

REFERÊNCIAS

1. Walton RE, Outhwaite WC, Pashley DF. Magnification: an interesting optical property of dentin. J Dent Res. 1976;55(4):639-42.

2. Broadbelt RHW, O’Brien WJ, Fan PL, Frazer-Dib JG, Yu R. Translucency of human dental enamel. J Dent Res. 1981;60(10):1749-53.

3. O’Brien WJ. Double layer effect and other optical phenomena related to esthetics. Dent Clin N Am. 1985;29(4):667-72.

4. Price RBT, Murphy DG, Dérand T. Light energy transmission through cured resin composite and human dentin. Quintessence Int. 2000;31:659-67.

5. Bassim N, et al. La stratification aux résines composites. JODQ. 2012;49(4):6-15.

6. Decerle N, Turpin Y, Desa C, Hennequin M. Le point sur la stratification esthétique des composites. Actual Odonto-Stomatol. 2011;256(Dez):341-52.

7. Correia A, Oliveira MA, Silva MJ. Conceitos de estratificação nas restaurações de dentes anteriores com resinas compostas. Revista Portuguesa de Estomatologia, Medicina Dentaria e Cirurgia Maxilofacial. 2005;46(3):171-78.

8. Dietschi D, Fahl Jr N. Shading concepts and layering techniques to master direct anterior composite restorations: na update. Br Dent J. 2016;221(12);765-

Prof. Dr. Fernando Hanashiro

Cirurgião-dentista, Mestre e Doutor em Dentística

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